Fábrica de Tecidos Codorna
A Fábrica de Tecidos Codorna foi um importante estabelecimento industrial localizado em Itajubá, Minas Gerais, que desempenhou um papel central na vida econômica e social do bairro Boa Vista e de seus trabalhadores por décadas.
HistóriaEditar
A fábrica pertencia à Companhia Industrial Sul Mineira. A indústria têxtil em Itajubá teve início em 1910 com a Codorna. O prédio onde funcionou a fábrica foi construído entre 1912 e 1913. As operações da fábrica ocorreram principalmente entre 1914 e 1966.
O início das atividades da fábrica coincidiu com a chegada da estrada de ferro cortando o bairro Boa Vista, o que impulsionou o desenvolvimento da área de agrícola para um bairro significativo. A fábrica iniciou suas operações com aproximadamente 250 operários. Suas atividades foram paralisadas em 1966 devido à falência. Para quitar dívidas, o prédio foi desmembrado e vendido, passando por diversas modificações para abrigar outras atividades industriais e comerciais. Por volta do final do século XX, alguns de seus prédios já estavam em demolição. Em 2009, restavam poucos vestígios identificáveis do prédio na Rua Dona Maria Carneiro. Parte do que sobrou foi reformado e transformado em um pequeno shopping center.
Localização e InstalaçõesEditar
A Fábrica de Tecidos Codorna estava localizada no bairro Boa Vista, descrito como o bairro industrial de Itajubá. O terreno poligonal onde foi edificada possuía uma área aproximada de 15.331 metros quadrados. Estava situada nas interconexões da Rua Dona Maria Carneiro com a Rua Miguel Braga e a Avenida Capitão Gomes. Uma figura delimita o perímetro onde se encontrava o prédio.
A edificação da fábrica ocupava cerca de 7.000 metros quadrados. Junto com construções anexas como o prédio do Clube Operário, refeitório, cabine de força e luz, depósitos, ferraria, carpintaria, e outros galpões, a área total construída somava 10.351 metros quadrados. A Companhia Industrial Sul Mineira também construiu casas e vilas operárias nas proximidades para seus trabalhadores. O complexo da fábrica ficava ao centro do terreno, com as vilas operárias ao seu redor.[1]
A construção da fábrica seguia a tipologia arquitetônica industrial inglesa, caracterizada pela junção fábrica/moradia no mesmo espaço. O prédio possuía linhas sóbrias, com telhados em três águas e platibanda. Havia uma construção diferenciada para o setor administrativo. Fotografias antigas mostram as características arquitetônicas e o bairro ao redor. A estrada de ferro cortava o bairro, e a antiga linha férrea no trecho próximo à fábrica foi transformada na Avenida Capitão Gomes.[1]
Operações e ProduçãoEditar
A fábrica produzia tecidos de algodão. Sua produção diária, no início, era de 7.200 metros de diversos tipos de tecido, incluindo riscados, xadrezes, brins e morins.
O maquinário utilizado era importado da Inglaterra, Estados Unidos e Alemanha. Havia aparelhos de fabricação norte-americana no depósito de algodão. As seções incluíam a Sala dos batedores, Alimentador automático, Ventilador, e Gaiolas para o processamento inicial do algodão.
Os processos de produção do fio e do tecido foram descritos por antigos operários. O algodão em pluma era penteado. A fiação utilizava filatórios convencionais a anel, onde as mechas eram estiradas e recebiam torção. A matéria-prima passava por limpeza em diversas etapas. Os fios eram enrolados em rolos.
No processo de tecelagem, os rolos de fios passavam pela urdideira (semelhante a uma gaiola) e pela engomadeira para receber goma e secar. Depois, os fios eram passados nos liços e entre os dentes do pente antes de irem para o tear. As espulas (canelas cheias de fio) eram trocadas nas lançadeiras dos teares. Os tecidos eram tingidos na seção de tinturaria e preparados para venda na sala de pano. Segundo um antigo operário, a maior parte dos tecidos produzidos era vendida para os estados do Paraná e Santa Catarina.
A fábrica possuía uma distribuidora de força, acionando 48 motores com vapor de uma caldeira e energia elétrica de usinas próprias da Companhia Força e Luz, proprietária da fábrica, fundada em 1908. Havia também oficinas mecânicas e de carpintaria, e locais de embalagem e depósito de tecidos.
Aspectos Sociais e Vida OperáriaEditar
A Fábrica Codorna era central na vida dos seus trabalhadores, abrangendo atividades laborais e recreativas. A estrutura de poder tinha o diretor da fábrica como figura central, exercendo controle sobre a moradia, atividades médicas, religiosas e de lazer.
A Companhia Industrial Sul Mineira construiu casas e vilas para os operários nas proximidades da fábrica, onde eles podiam morar pagando aluguéis baixos. O Clube Operário também fazia parte do complexo, e os trabalhadores frequentavam bailes ali gratuitamente.
Havia um cinema no bairro, o Cine Paratodos, localizado em frente à Codorna, que era frequentado predominantemente pelos operários da fábrica e suas famílias. Apesar de mais baratos, os filmes exibidos eram os mesmos do Cine Apolo, em horários diferentes.
O trabalho na fábrica envolvia tarefas repetitivas, como "ir pra lá e vir pra cá" trocando espulas. Os operários sentiam que apenas trabalhavam e não saíam da fábrica durante o turno. No entanto, muitos antigos operários tinham memórias positivas do tempo que trabalharam na Codorna. Havia a percepção de que a direção se preocupava em oferecer o melhor para os trabalhadores. No dia 1º de Maio, os patrões ofereciam churrascos para os empregados.
Falência e Tentativas de TombamentoEditar
As atividades da fábrica foram paralisadas devido à falência em 1966.
Entre 1997 e 1998, o prédio da antiga fábrica foi objeto de tentativas de tombamento como patrimônio histórico e cultural pelo Conselho Municipal de Patrimônio Histórico de Itajubá. O Conselho considerava o prédio uma edificação importante com expressiva representação arquitetônica, histórica e cultural para o município, ligada a fatos memoráveis de sua história. O tombamento era visto como uma forma de preservar a memória e a história local contra os "efeitos destruidores do presente". A fábrica era vista como um empreendimento grandioso e uma das grandes realizações de Wenceslau Braz.
Contudo, os proprietários resistiram ao tombamento, alegando que o imóvel havia perdido seu valor histórico-cultural devido às transformações sofridas. Eles argumentavam que o tombamento constituiria um "confisco" e um impedimento ao direito de propriedade e ao desenvolvimento local. A fábrica estava localizada em uma área central e valorizada da cidade, o que a tornava atraente para interesses imobiliários e comerciais. As tentativas de tombamento geraram conflitos entre os interesses públicos (preservação) e privados (propriedade), e até mesmo conflitos internos no poder público.
Apesar dos esforços do Conselho, que chegou a tentar agilizar o processo de tombamento para evitar a descaracterização do prédio, o tombamento da fábrica não foi concretizado. As memórias dos antigos operários, que ofereciam outra perspectiva sobre a fábrica, não foram priorizadas nas justificativas do Conselho, que focaram na "história oficial".